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Contra-Ataque,

28.02.2018

Postado por Colaboradoras

Tiago Leifert: a pizza de strogonoff

Quando assisti pela primeira vez ao Tiago Leifert no comando do Globo Esporte, pensei que era uma versão humana do personagem Jar Jar Binks. Para quem não é familiarizado com a saga de Star Wars, Jar Jar Binks é um chato personagem da segunda trilogia da série cinematográfica de George Lucas. Concebido para ser uma contrapartida cômica, como os robozinhos CP3O e R2D2, acabou virando apenas uma piada melancólica, como a do Tio Pavê na ceia de ano novo. Passados alguns anos, percebo que Leifert consegue ser mais que uma piada sem graça, ele consegue ser mais indigesto que uma pizza de strogonoff, essa peculiar iguaria encontrada nos confins de Santa Catarina.

Nos últimos dias, Tiago Leifert falou à uma mulher negra que representatividade não leva a nada, porque claro, ele deve entender muito de representatividade. Dias depois, em sua coluna na revista QG proferiu que evento esportivo não é lugar de manifestação política (…)!

Achei muito curioso um jornalista que já foi âncora de um dos jornais esportivos mais assistidos do país falar tamanha verborreia, mas como não sei onde termina a acefalia e começa o caráter duvidoso, resolvi listar alguns casos que política e futebol/esporte interligaram-se, para o bem ou para mal.

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Brasil X Haiti – O Jogo da Paz, 2004, Porto Príncipe
Em 2004, o Haiti era assolado por uma grave crise política devido a uma Guerra Civil. O então presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva enviou soldados para ajudar na recuperação do país. Em resposta ao ato do presidente o primeiro ministro haitiano, Gerard Latirtue, respondeu que, se realmente quisesse ajudar o Haiti, o Brasil teria enviado a seleção canarinho ao invés de soldados. Lula, de pronto, “escalou” a seleção para um amistoso que ficou conhecido como Jogo da Paz, pois visava uma campanha de desarmamento no país. A seleção foi ovacionada por mais de 150 mil haitianos, fãs do futebol brasileiro.

Arquivo CBF

Arquivo CBF

Partida da Morte – Kiev, Ucrânia, 1942 – Dínamo de Kiev
Jogo Realizado entre prisioneiros de guerra soviéticos e soldados nazistas. Mesmo sabendo que a vitória poderia ser fatal, os jogadores do time soviético entraram em campo sem realizar a saudação nazista e venceram a partida contra os alemães. Boa parte do time vencedor foi executada, os poucos sobreviventes foram incumbidos de propagar a história do jogo como símbolo de resistência à ocupação nazista na cidade de Kiev.

Mundialito – Estádio Centenário, Uruguai, 1981
Realizado pelo então presidente da Fifa, João Havelange, o mundialito foi uma competição de futebol que unia todos os vencedores de Copas do Mundo de 1930 a 1978, realizada para ser uma grande propaganda a favor da ditadura militar no Uruguai, após aquela perder um plebiscito para sair do poder um mês antes da competição. A seleção uruguaia venceu o campeonato, mas, ao contrário do que esperavam os militares, o Centenário inteiro gritava: “irá acabar a ditadura militar”! O que fez com que os generais saíssem pela porta dos fundos do estádio.

Copas de 1934 e 1938 – Itália e França
As copas de 1934 e 1938, ambas vencidas pela Itália, foram uma grande propaganda fascista do ditador italiano Benito Mussolini. Os jogadores italianos entravam em campo com um “recado motivacional” de Mussolini: “Vencer ou arcar com as consequências”. Também faziam a saudação nazista antes de entrar em campo.

Olimpíadas de 1968 – Cidade do México
Os atletas norte-americanos Tomie Smith e John Carlos, com as medalhas de ouro e bronze dos 200 metros rasos, sobem ao pódio com a cabeça abaixada, braço erguido e punho fechado em uma referência ao movimento dos Panteras Negras, grupo que combatia a discriminação racial nos Estados Unidos. Esse ato é considerado umas das maiores manifestações políticas na história do esporte.

Muhammad Ali – Estados Unidos, 1967
Em abril de 1967, o campeão mundial de boxe Muhammad Ali recusou-se a servir o exército norte americano na Guerra do Vietnã, ato que lhe custou a perda do cinturão. Vemos que não somente no futebol está a política…

Foto de John Rooney (AP)

Foto de John Rooney (AP)

Jesse Owens – Estádio Olímpico Berlin, 1936
O atleta afro americano Jesse Owens recusou-se a olhar para a tribuna onde estava o ditador nazista Adolf Hitler. Além disso, foi ganhador de quatro medalhas de ouro, contrariando a crença ariana de superioridade. Em sua biografia, Owens cita a importância desse ato tanto para combater tanto o racismo nazista quanto o norte americano.

Democracia Corinthiana – São Paulo, década de 80
Liderada pelo lendário jogador Sócrates Brasileiro, foi a maior manifestação ideológica do futebol no Brasil. Além de um contexto revolucionário na forma de gestão e participação democrática de jogadores, funcionários e dirigentes do clube paulista, esse movimento teve uma grande contribuição para as Diretas Já.

Foto de Filme Democracia em Preto e Branco (reprodução).

Foto de Filme Democracia em Preto e Branco (reprodução).

Gol de Mão Maradona – México, 1986
Três anos após a Guerra das Malvinas, Argentina e Inglaterra duelaram, mas, dessa vez, em uma Copa do Mundo. Durante as quartas-de-finais, a Argentina abriu o placar com um gol de mão do craque Diego Maradona. Inconformados, os inglesas ainda tiveram que assistir Maradona fazer um dos gols mais bonitos da história das copas, driblando metade do time inglês a partir do meio de campo. O Gol de mão de Maradona ficou conhecido com a Mão de Deus ou La Mano de Dios. Essa vitória foi considerada a “vingança pacífica” da Argentina sobre a Inglaterra.

Maradona a mão de deus

Barcelona X Real Madrid – década de 40
Assim que assumiu o governo espanhol após a guerra civil no país, Franco tentou de todas as formas acabar com qualquer orgulho ou identidade catalã. O Barcelona foi um dos seus alvos, sendo obrigado a mudar de nome e de escudo. Mas era nos jogos contra o Real Madrid – o time de Franco – com o Camp Nou lotado, que a multidão gritava que o orgulho catalão era impossível de reprimir.

Pode abrir uma garrafa de Pinot Noir e não querer ouvir “Fora Temer”, mas qualquer borda de catupiry sabe que esporte e manifestação política possuem relações mais profundas que recheio de galinha e coxa creme.*

 

*Nota da autora: A retórica feita à coxa creme, a borda catupiry e ao Pinot não possuem caráter ofensivo aos citados, uma vez que a autora é grande apreciadora dos itens listados.

Por Josie Rodrigues

A Bola que Pariu