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, Futebol Feminino

24.03.2017

Postado por Caroline Araujo

Mulheres do Futebol: Marcia Tafarel

Em uma época em que o futebol era, praticamente, exclusividade para os homens, ela mostrou que as mulheres sabem jogar bola como ninguém – com qualidade, tática e muito esforço. Márcia Tafarel, a Tafa, fez parte da Seleção Brasileira de Futebol Feminino atuando como meia volante em mundiais e na primeira Olimpíada do Futebol Feminino, em Atlanta. Além de dar show com a bola nos pés, Tafa atuou como treinadora de futsal feminino, sendo escolhida pela Federação Paulista de Futsal como a melhor treinadora de 2003. Atualmente, Márcia Tafarel vive na Califórnia, nos Estados Unidos.

Tafarel Arquivo Pessoal

Marcia, gostaria que você começasse contando como foi o início da sua carreira como jogadora, ainda no Rio Grande no Sul, e como começou o seu interesse por futebol.

O início da minha carreira no Rio Grande do sul começou em 1982, quando minha mãe me levou para um treino de uma equipe que estava sendo organizada na cidade de Bento Gonçalves. Eu tinha 13 para 14 anos de idade na época e jogava na rua com os meninos desde pequena. Futebol sempre foi um dos esportes que sempre assistia na televisão, mas gostava também de outros esportes como o voleiball, o basketball, no qual representava a minha escola nos Jogos da Primavera, competição estudantil da época.

Do Rio Grande do Sul você mudou para São Paulo. Como foi para você essa mudança para viver de futebol?

Foi difícil no começo, porque sempre me preocupei com os estudos e com o meu sustento. Mudei para Campinas no final de 1987. Gostava da cidade de Campinas, mas queria trabalhar pois não recebia para jogar, tínhamos apenas ajuda de custo. Consegui um emprego na Fundação Bradesco alguns meses depois e assim podia trabalhar do meio dia ate às 9 da noite como auxiliar no Dept. Odontológico da Fundação Bradesco. Treinava por conta própria no período da manhã e jogávamos de final de semana. Terminei o ensino secundário alguns anos depois.

Como foi a convocação para a Seleção Brasileira?

Em 1988 fui jogar contra o Radar, que na época era a equipe base da Seleção Brasileira de Futebol Feminino. Acredito que fui bem e me convocaram para treinamentos na seleção. Porém, como estava começando na Fundação Bradesco, não quis perder o emprego por uma convocação que não era para uma competição oficial da Fifa. Continuei treinando e jogando pelo Saad, até que em 1991 sairia a convocação oficial para disputar o primeiro mundial pela Fifa, na China. Fui convocada e pedi licença do trabalho para poder ir disputar o Sul-Americano da categoria. Depois disso, tive que decidir entre a Seleção Brasileira e meu emprego. Optei pela convocação e fui para o Rio de Janeiro, onde ficamos em treinamento por vários meses na Escola de Educação Física do Exército, na Urca.

Tafa, com a camisa 5/Reprodução

Tafa, com a camisa 5/Reprodução

Acervo Pessoal

Tafa, a quarta em pé da esquerda para a direita/Acervo Pessoal

Você participou de Mundiais e das Olimpíadas. Fale um pouco sobre essas experiências e como elas mudaram sua vida profissional.

Participar em competições de alto nível como Mundial e Olimpíadas dá uma visibilidade para qualquer atleta. Na nossa época não tinha tanta cobertura, mas a TV Bandeirantes sempre nos deu espaço e saíam matérias e reportagens na época. A vida profissional depois destas competições não mudou muito, continuei a trabalhar na Associação Sabesp de São Paulo e a jogar futsal por esta organização.

Fale um pouco do seu trabalho e experiência também como treinadora.

Na associação Sabesp fui convidada pelo Presidente Persio Faulim e pela treinadora da equipe principal a treinar as equipes de Futsal de base da Associação Sabesp, em 1997. Eu gostei da ideia e comecei a treinar a equipe juvenil, no qual tínhamos um grupo muito talentoso com jogadoras que posteriormente viriam a fazer parte da equipe adulta e também viriam a ser convocadas para a Seleção Brasileira de Futsal. Conquistamos quase tudo o que disputamos de 1997 a 2003, quando fomos Campeãs Brasileiras do primeiro Campeonato Brasileiro Juvenil. Em 2003, fui escolhida pela Federação Paulista de Futsal a melhor treinadora do ano. Em abril de 2004 resolvi dar uma guinada na minha vida.

Estava fazendo faculdade de Gerenciamento em Turismo e Hotelaria na Unip e queria aprender inglês. A Sissi me convidou para vir para os Estados Unidos e me alertou para trazer todos os recortes de jornais e reportagens que falassem de mim, pois poderia aplicar para o O1 Visa, que é para pessoas com qualidades extraordinárias. Resolvi ficar na Califórnia, que é onde resido desde que vim para cá. Hoje, trabalho como treinadora em tempo integral em duas organizações; o Community Youh Center e Walnut Creek Soccer Club, treinando crianças de 4 a 18 anos no CYC e de Sub-10 e Sub-14 no Walnut Creek Soccer Club.

Walnut Creek Soccer Club

Walnut Creek Soccer Club

Como você tomou a decisão de sair do Brasil, considerado o país do futebol, e se mudar para os Estados Unidos?

Não foi uma decisão fácil, mas para mim, que sempre fui independente, foi uma decisão no qual eu buscava aprimoramento. Queria aprender porquê o futebol feminino no país do Tio Sam era respeitado e no Brasil sofríamos tanto preconceito. A mudança foi feita e a adaptação muito fácil. Vim para um estado que é multi-cultural e onde poderia trabalhar sem problema algum na área do futebol feminino.

Você iniciou em uma época em que a mulher tinha um espaço muito restrito na área. Como foi para você essa experiência? Você enfrentou resistência?

Muita resistência. Primeiramente da família, que via no futebol feminino algo inaceitável. A família do lado do meu pai não via com bons olhos. Mas a minha mãe, junto com meu avô, sempre foram meus incentivadores. O outro obstáculo vinha do preconceito cultural, de não aceitar mulher jogando futebol. Éramos xingadas e ofendidas verbalmente. Mas só se consegue algo quando se planta a semente. Mudança cultural é difícil, mas tínhamos que plantar esta semente e quebrar tabus.

Como você, que atua há tantos anos no futebol feminino, o vê atualmente? Acredita que ainda faltam incentivos para a categoria feminina no país?

Os incentivos à modalidade têm avançado bastante no que diz respeito à Seleção Brasileira, porém, nos clubes ainda faltam investimentos para uma continuidade. Alguns clubes formam equipes e emprestam apenas o nome, não se preocupando com a estrutura oferecida. Com as mudanças na lei, no qual obrigam os clubes a terem futebol feminino para disputar a Libertadores, vemos isso acontecer muito. O clube se filia a uma equipe existente, mas não se preocupam em dar a estrutura e isso me preocupa.

O que você achou dessa medida (da Conmebol)?

Como citei anteriormente, é uma inciativa válida, mas se tem que ter futebol feminino no clube, o clube deve providenciar a estrutura necessária à equipe. Não pode só emprestar o nome e deixar as jogadoras de lado não dando apoio ou suporte para se manter a equipe por um longo período.

Para encerrar, qual conselho você deixaria para as meninas que, hoje, sonham em se tornarem grandes jogadoras de futebol?

O meu conselho sempre será de perseverança, determinação. No Brasil nada é fácil, temos que lutar para realizar os sonhos. Este é meu conselho, não desista! Mesmo que uma porta se feche aqui, lute para que outra se abra ali. Seja forte, quebre barreiras, lute por seus ideais.

 

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