21.08.2017
Postado por Mariana Moretti
Avaí 1×1 São Paulo – R21 Campeonato Brasileiro 2017
Imagine você, leitor e leitora, que estão sentados na mesa de um bar, comendo alguns petiscos, apreciando uma boa gelada e conversando descontraidamente. De repente, o dono do bar pede que vocês se levantem porque vai precisar das cadeiras que vocês estão sentados para emprestar para outros clientes. Não satisfeito, manda que vocês saiam do local que estão e fiquem em um cantinho apertado, longe da maior parte dos outros que estão no bar. Para sair dali, só se alguém ceder o espaço. Mas ninguém quer ceder. E como é difícil esperar alguém ceder! Além disso, ele pede que o garçom apenas sirva cerveja à temperatura ambiente, reservando as mais geladas aos outros clientes. Você estranha, mas a cada “pedido” do dono do bar, você cede, afinal, o que é que tem perder a cadeira quando ainda se está em um bom local? Mas o que é que tem perder o bom local se ainda se tem a cerveja geladíssima? Ora, o que é perder a cerveja gelada se ainda… espere um pouco… o que nos restou?
Uma situação constrangedora para os apreciadores da boa e velha boemia. E olha que nem precisa de tanta coisa assim para desfrutar de bons momentos, mas a cerveja gelada, essa sim não pode faltar nunca! Agora convido você, leitor e leitora, a imaginar a mesma situação infame substituindo esses personagens para nosso contexto em questão: a situação que não é de hoje e que o Tricolor Paulista está fadado a enfrentar sabe-se lá até quando. O bom local que estávamos, figurando entre os melhores times do Brasil, fazendo bonito nos campeonatos – para não citar a Libertadores da América, que saudade de você! Levantando a taça! Faz anos que não temos essa visão sóbria de títulos. Embriagamo-nos com promessas não cumpridas. O que compõe o bar, sendo seu alicerce e sua filosofia, são os nossos jogadores, a nossa história, os nossos possíveis títulos. Tudo isso entregue de bandeja aos outros clubes do próprio futebol brasileiro e também do futebol estrangeiro, caso pague mais. A cerveja gelada é o futebol bonito de se ver nos pés dos jogadores, nos passes, na técnica e no improviso, na arte e na malandragem.
Como toda paixão, você aprecia sem moderação. Enfim, chegamos ao dono do bar. Bem, o dono é o dono. Eis um personagem que não muda nunca, independente da história e da época que ela é contada. Entre mandos e desmandos, quem sofre somos sempre nós, meros mortais. Quiçá não tarde o dia que possamos nos rebelar contra tal dono, fazer tamanho escarcéu capaz de que ele deixe sua função e seja substituído por outro. Porque ao que parece, esse dono de bar não gosta de cerveja. Ele gosta mesmo é de vendê-la.
Quando foi mesmo que passamos a nos conformar com essa situação, meu Tricolor Paulista, ora chamado de Soberano?
Transportamo-nos do bar até Santa Catarina, em um local que também tem tudo a ver com boemia: a Ressacada. A chuva varre o campo e o vento empurra a bola para fora dos pés dos jogadores que não a dominam. A chuva ensopa o gramado e o vento muda a trajetória dos passes que não alcançam os pés dos jogadores. Leônidas da Silva, lá de cima da nuvem da chuva, treme de ver a maltratada bicicleta. A maldição do arqueiro do São Paulo persiste e requer uma solução milagrosa, pois a camisa 1 parece pesar demasiadamente no corpo dos que vieram depois de Ceni. O vento leva embora as ideias, a inventividade, e conforma-se o time: hoje o tempo está feio para o Tricolor. Logicamente que tudo isso aconteceu porque as condições climáticas não foram favoráveis à vitória.
Dois pênaltis caídos do céu, juntamente com as águas que lavaram o campo. Um chute convertido para cada lado e o infame placar de 1×1 fechando o domingo da torcida mais esperançosa desse país. Quando a molecada joga bola na chuva, descalça, e o placar permanece nesse desalento, a solução é clara como água: se prolonga a peleja sob o famoso “zero a zero vai a dois!” e aí o futebol ganha mais uma chance. E onde está a molecada do São Paulo para conferir criatividade ao judiado placar tricolor no Brasileiro? Cadê a chance de melhora do nosso futebol?
Eis que no campo, banhado pela mesma chuva que leva embora os três pontos tão suados a cada etapa, lamenta-se um jogador. O mesmo que, quando todo o elenco inunda o juiz de reclamações por marcar o pênalti para o time catarinense, se agacha no chão para recuperar o ar da correria durante a partida. Faça chuva ou faça sol, em 5 jogos já conta com 5 gols, sendo o artilheiro do time paulistano nestes dias nublados.
Hernanes é hoje o único inconformado com a situação a qual o futebol são-paulino chegou, basta ver seu desempenho, que destoa do marasmo dos demais. É a personificação da torcida dentro do campo: joga por ele e por todos os outros. Tem carregado o desaparecido elenco no pé direito e o coração da torcida no pé esquerdo. E que sorte a nossa que ele sabe conciliar ambos. A montanha russa tricolor, de poucos altos e muitos baixos, tem sido constante nas últimas partidas. A instabilidade, que passou a ser rotina do clube, é alarmante e não tem prazo de validade, quando achamos que o time ia finalmente vingar, naquele lampejo de esperança contra o Botafogo, voltamos ao limbo da má fase que enfrentamos.
Sigo acreditando, pois torcer para o São Paulo atualmente tem sido um ato de fé. E o que mais nos resta quando nos tiraram tudo? Não é a toa que seguimos escalando esse abismo que fomos lançados já há algum tempo, seguindo ninguém menos que o jogador cujo apelido é “Profeta”. Mas, como no exemplo do bar, ainda dependemos dos outros e ninguém quer ceder lugar – com a vitória da Chapecoense, voltamos ao abismo do campeonato, a zona da degola. E como se não bastasse, ainda temos que ouvir do “dono do bar” que caso mergulhemos de cabeça nesse abismo, que para ele parece já ser realidade e não uma temível possibilidade, ele conta com a força e apoio da torcida. Pois bem, nada de novo no “front”. Desde que o mundo é mundo, segue o jogo e infelizmente a regra é clara, tem gente que ganha com a fé e, porque não dizer, com a paixão dos outros.
Dizem que para alienar um povo, basta apagar sua memória. Apagar suas raízes, sua cultura, sua trajetória. Tenhamos memória para não nos conformamos diante dessa situação. Ode a nós, os inconformados. Vamos, São Paulo!
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